Quem Precisa do Evangelho? (Sermão – C.H.Spurgeon)

nº1345

Pregado no Domingo, 25 de março de 1877
por Charles Haddon Spurgeon

No Tabernáculo Metropolitano, Newgton, Inglaterra

“Os sãos não necessitam de médico, mas, sim, os que estão doentes; eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores ao arrependimento.” Marcos 2:17


“Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios.” Romanos 5:6


“Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” Romanos 5:8


“palavra fiel, e digna de toda a aceitação, que Cristo Jesus veio ao mundo, para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal.” I Timoteo 1:15

 

 

Na noite de quinta-feira passada, com considerável dificuldade, vim aqui para pregar o evangelho de Jesus Cristo e usei em minha pregação alguns dos mais claros textos que se possa imaginar, repletos dos mais simples elementos do Evangelho. Em poucos minutos o sermão produziu uma colheita. A congregação era escassa devido ao mal tempo, e vocês não esperavam que seu pastor pudesse pregar. Porém, apesar de todas as circunstâncias, três pessoas passaram à frente sem que ninguém requisitasse isso delas para dar testemunho de que haviam encontrado a paz com Deus. Se o número de pessoas era maior, eu não sei. Contudo essas três buscaram aos irmãos e confessaram de maneira sincera e de todo coração o feito bendito de que, pela primeira vez em suas vidas, tinham entendido o plano de salvação. Então me pareceu que se um tema tão descomplicado como o Evangelho foi de tão repentino proveito, eu deveria sujeitar-me de novo à temas deste tipo.

 

Se um agricultor descobre que algum determinado tipo de semente tem resultado tão eficaz que produz uma colheita tal como nunca antes ele obteve, certamente ele usará de novo essa semente e semeará mais dela. Esses processos eficazes de produção agrícola devem se manter e ser usados em maior escala. Por isso, nesta manhã, irei pregar o simples A B C do Evangelho; os primeiros rudimentos da arte da salvação, e dou graças a Deus por que isto não será novo para mim. Que Deus o Espírito Santo, em respostas as orações de vocês, nos conceda no dia de hoje uma recompensa na mesma proporção da quinta feira passada, e se é assim, nosso coração ficará muito feliz.

 

De um abundante número de textos, eu selecionei os quatro mencionados acima para proclamar a verdade de que a missão de Nosso Senhor estava relacionada com os pecadores. Para que veio Cristo ao mundo? Para quem veio? Estas são perguntas muito importantes e as Escrituras tem as claras respostas. Quando os filhos de Israel encontraram pela primeira vez o Maná fora do acampamento, disseram um aos outros: “Maná? O que é isto?”, porque não sabiam o que aquilo era. Lá estava aquela pequena e redonda substância, tão diminuta como a geada. Não há duvida de que olharam o Maná , pegaram nele, o tocaram com suas mãos, cheiraram ele, e como se alegraram quando Moises disse-lhes: ” É o pão que Jeová dá para vocês comerem”. Não passou muito tempo antes que pudessem provar essa boa nova, pois cada homem recolheu uma medida completa, e levou para sua casa, e a preparou a seu gosto.

 

Nesse instante, em relação ao Evangelho, há muitos que poderiam exclamar: “Maná?”, por que não sabem o que ele é! Também, muito frequentemente, equivocam-se no que se refere a seu sentido e propósito, e consideram que é algo como uma lei superior, ou um sistema mais fácil de salvação por obras; e por isso também se equivocam em sua ideia sobre as pessoas a quem o Evangelho está dirigido. Imaginam que, certamente, as benções da salvação estão destinadas para as pessoas que merecem elas, e Cristo deve ser o Redentor daqueles que tem acumulado méritos. Sobre o princípio de “bem por bem”, chegam à conclusão que a graça é para quem possui excelência, e que Cristo é para o virtuoso. Portanto, é muito útil que recordemos continuamente aos homens o que é o Evangelho, e para quem ele foi enviado ao mundo; porque ainda que a maioria de vocês o saiba muito bem, e não necessitam que diga-lhes, no entanto, há multidões ao nosso redor que persistem em graves erros e precisam ser instruídos uma e outra vez nas mais básicas doutrinas da Graça.

 

Há menos necessidade de laboriosas explicações dos profundos mistérios do que de simples explicações das mais simples verdades. Muitos homens somente necessitam de uma simples chave para abrir o cadeado e abrir a porta da fé, e tenho a esperança de que Deus, em sua infinita misericórdia, porá tal chave em suas mãos nesta manhã.

 

Nossa missão é mostrar que o Evangelho está dirigido aos pecadores, e fixa seus olhos nos culpados; que ele não foi enviado ao mundo como uma recompensa para as pessoas boas ou excelentes, ou para aquelas que pensam que tem certas qualidades, ou que estão preparadas para o favor divino; mas antes está destinado aos que descumprem a lei, aos indignos, aos ímpios, aos que tem se extraviado como ovelhas perdidas, ou os que tem abandonado a casa de seu pai como o filho pródigo. Cristo morreu para salvar os pecadores, e Ele justifica aos ímpios. A verdade é suficientemente clara na Palavra, mas como o coração da coices contra ela, devemos insistir nela com muita dedicação.

 

  1. Primeiro, um olhar superficial para a missão de nosso senhor basta para mostrar que sua obra foi para o pecador. Porque, queridos irmãos, a vinda do Filho de Deus para este mundo como Salvador significou que os homens necessitavam ser libertados de um mal muito grande, por meio de uma mão divina. A vinda de um Salvador, que mediante sua morte proporcionaria o perdão para o pecado do homem, significou que os homens eram extremamente culpados e incapazes de procurar o perdão por meio de suas próprias obras. Vocês nunca teriam visto um Salvador se não houvesse ocorrido uma queda. O Éden caído foi um prefácio necessário para as angústias do Getsamani. Vocês nunca teriam conhecido uma cruz, nem um salvador sangrante nela, se não houvessem escutado primeiro da árvore da ciência do bem e do mal, nem de uma mão desobediente que arrancou a fruta proibida. Se a missão de nosso Senhor não se referisse ao culpado, seria então – até onde podemos entender – uma tarefa totalmente desnecessária. O que justifica a encarnação, se não a ruína do homem? O que pode explicar a vida de sofrimento de nosso Senhor, se não a culpa do homem? Acima de tudo, o que explica sua morte e a nuvem sob a qual morreu, se não o pecado do homem? Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; mas o SENHOR fez cair sobre ele a iniqüidade de nós todos“.Essa é a resposta a um enigma que, de qualquer outra maneira, não teria resposta.

 

Se olharmos o pacto sob qual veio nosso Senhor, logo perceberemos que sua orientação é para os homens culpados . A benção do pacto de obras tem a ver com os que são inocentes, àqueles são prometidas grandes bênçãos. Se houvesse existido uma salvação por obras, haveria sido por meio da lei, já que a lei é integra, justa e boa; mas o novo pacto evidentemente trata com pecadores, porque não fala de recompensa ao mérito, mas antes, promete sem condições: “Serei misericordioso quanto as suas injustiças e jamais me recordarei de seus pecados. Se não houvesse existido pecados, iniquidades e injustiças, não haveria tido necessidade do pacto da graça, do qual Cristo é o Mensageiro e o Embaixador. O mais ligeiro olhar ao caráter oficial de nosso Senhor como o Adão de um novo pacto deveria ser suficiente para convencer-nos de que sua missão é para os homens culpados. Moisés vem para mostrar para nós como o homem santo deve comportar-se, mas Jesus vem para revelar como o impuro pode ser limpo.

 

Sempre que escutamos algo da missão de Cristo é descrito como uma missão de misericórdia e graça. Na redenção que está em Cristo Jesus é a misericórdia de Deus a que é sempre exaltada. Nos salvou por sua misericórdia. Ele, por meio de Jesus, por sua abundante misericórdia, perdoa nossas ofensas. A lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade nos vieram por Jesus Cristo.” “Quanto mais abundou para muitos a graça de Deus e a dádiva pela graça de um só homem, Jesus Cristo” . O apóstolo Paulo, que foi quem explicou de maneira mais clara o evangelho, estabelece a graça como a única palavra em que se apoiam as reviravoltas. “Onde o pecado abundou, superabundou a graça” e “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto não vem de vós, pois é dom de Deus.” e “ Assim também a graça reine pela justiça para vida eterna, por meio de Jesus Cristo nosso Senhor.”

 

Mas, irmãos, a misericórdia implica pecado: não se pode reservar nenhuma misericórdia para os justos, porque é a justiça mesma quem lhes outorga todo o bem. Assim mesmo, a graça só pode ser dada aos pecadores. Que graça necessitam aqueles que tem guardado a lei, e merecem o bem das mãos de Jeová? Para eles, a vida eterna seria mais bem uma dívida, uma recompensa muito bem ganhada; mas quando se toca no tema da graça, de imediato há de eliminar-se a ideia de mérito, e é necessário introduzir outro principio. Só se pode praticar a misericórdia ali onde existe pecado, e a graça não pode ser concedida se não para aqueles a quem não tem mérito nenhum. Isto é muito claro e , no entanto, todo o conteúdo da religião de alguns homens está baseado em outra teoria.

 

O fato é que quando começamos o estudo do evangelho da graça de Deus, vemos que sempre volta seu rosto até ao pecado, da mesma maneira que o médico olha para a enfermidade, ou a caridade atenta para a necessidade. O evangelho lança seus convites, mas, que são as convocações? Não estão dirigidos àqueles que estão carregados com o peso do pecado , e estão fatigados tratando de escapar de suas consequências? Chama a toda criatura porque toda criatura tem suas necessidades, mas especialmente diz: “Deixe o ímpio seu caminho, e o homem iníquo seus pensamentos”. Convida o homem que não tem dinheiro, ou dito em outras palavras, sem nenhum mérito. Chama aqueles que estão necessitados, e sedentos, e pobres, e desnudos, e todas essas condições são figuras de estados equivalentes produzidas pelo pecado.

 

Os próprios dons do evangelho implicam pecado; a vida é para os mortos, a vista para os cegos, a liberdade é para os cativos, a limpeza é para os sujos, a absolvição é para os pecadores. Nenhuma benção do evangelho é proposta como uma recompensa, e não se faz nenhuma convocação a quem reclama as bênçãos da graça como algo a que tem direito; os homens são convidados a vir e receber dons gratuitamente de acordo com a graça de Deus. E quais são os mandamentos do evangelho? O arrependimento. Todavia, quem se arrepende, senão um pecador? A fé. Mas crer não é um mandamento da lei; a lei só fala de obras. Crer tem que a ver com os pecadores, e com o método de salvação por meio da graça.

As descrições que o evangelho faz de si mesmo, usualmente, apontam para o pecador. O grande rei que faz uma festa e não encontra a nenhum convidado que se sente à mesa entre aqueles que naturalmente se esperava que chegassem, mas que obriga aos homens que vão pelos caminhos e pelos becos a entrarem na sua festa. Se o evangelho se descreve a si mesmo como uma festa, é uma grande festa para os cegos, para os coxos, e para os aleijados; se ele se descreve a si mesmo como uma fonte, é uma fonte aberta para limpar o pecado e as impurezas. Em todas as partes, em todo o que faz e diz e dá aos homens, o evangelho manifesta-se como o amigo do pecador. O tema de seu Fundador e Senhor é: “este recebe os pecadores”. O evangelho é um hospital para os enfermos, ninguém se não os culpados aceitará seus benefícios; é remédio para os enfermos, os sãos e os que crêem em sua justiça própria nunca poderão apreciar suas porções salvadoras. Aqueles que imaginam possuir alguma excelência ante Deus nunca se preocuparão de serem salvos pela graça soberana. O evangelho, eu digo, foca o pecador. Nessa direção, e só nessa direção, lança suas bênçãos.

 

E irmãos, vocês sabem que o evangelho sempre há encontrado seus maiores troféus entre os maiores pecadores: alista seus melhores soldados não somente das fileiras dos culpados, se não que também das classes dos mais culpados. Disse nosso Senhor a Simão Pedro: “uma coisa tenho a dizer-te. E ele disse: Dize-a, Mestre. Certo credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos dinheiros, e outro cinquenta. E, não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Dize, pois, qual deles o amará mais?”. O Evangelho se baseia sobre o principio de quem teve muito para ser perdoado, esse irá amar mais, e assim seu Senhor misericordioso se deleita buscando os mais culpados e manifestando-se a eles com amor abundante e sobre-abundante, dizendo: “apago como nevoas tuas rebeliões e como nuvem seus pecados”. Entre os grandes transgressores encontra aos que mais intensamente o amam, uma vez que são salvos, e destes recebe a boa vinda mais cordial, e neles obtêm os seguidores mais entusiastas. Uma vez que são salvos, os grandes pecadores coroam essa graça imerecida com seus diademas mais ilustres. Podemos estar bem seguros que Ele tem seus olhos postos nos pecadores, posto que encontre sua maior glória nos maiores pecadores

 

Há outra reflexão que está muito perto da superfície, no caso, que se o evangelho não olha para os pecadores, a que mais poderia olhar? Parece que tem existido ultimamente um ressurgimento do antigo espírito que apresenta objeções, de maneira que os orgulhosos fariseus constantemente nos dizem que a pregação da justificação pela fé tem sido conduzida mais fora de seus limites, e que estamos conduzindo as gentes a valorizar menos a moralidade ao pregar a graça de Deus. Esta objeção, frequentemente refutada, está saindo de seu esconderijo outra vez, por que o Protestantismo está perdendo sua seiva e sua alma. A mesma força e coluna vertebral do ensino dos Reformadores foi essa grande doutrina da graça, que a salvação não é por obras, mas sim, somente pela graça de Deus; e como os homens estão se afastando da Reforma, e estão se deixando influenciar pela Igreja Católica Romana, estão deixando de lado essa grandiosa verdade da justificação pela fé somente, e pretendendo que lhe tenham temor. No entanto, oh! Quais miseráveis e tontos são muitíssimos homens em relação com esse tema! Proponho a todos eles uma pergunta: para quem, senhores, olharia o evangelho, se não aos pecadores, porque que coisa vocês são, se não pecadores? Vocês que falam que a moralidade é lastimada, que a santidade é ignorada, o que vocês têm a ver com qualquer delas?

 

As pessoas que usualmente recorrem a estas objeções, geralmente, fariam melhor em não tocar nesses temas. Em geral, esses furiosos defensores da moralidade e da santidade são sumamente liberais, enquanto que os crentes na graça de Deus são frequentemente acusados de puritanismo e rigidez. Ele que mais se adianta em falar contra as doutrinas da graça é frequentemente o homem que mais necessita delas, enquanto o que se opõe as boas obras como a base para se confiar, é precisamente a pessoa cuja vida está cuidadosamente dirigida pelos estatutos do Senhor. Saibam, oh homens, que não vive na face da terra um homem a quem Deus possa olhar com prazer se considerar esse homem à luz de Sua lei. “Cada um havia se desviado, e juntamente se corromperam. Não há quem faça o bem, nem sequer um só.” Nenhum coração, por natureza, é são e justo ante Deus, nenhuma vida é pura ou limpa quando o Senhor vem para examinar ela com Seus olhos que tudo o vêem. Estamos encarcerados na mesma prisão com todos os culpados, se não somos igualmente culpados, se somos culpados na medida de nossa luz e nosso conhecimento, e cada um é condenado justamente porque temos desviado nosso coração e não temos amado ao Senhor. A quem, então, poderia o Evangelho mirar, se não dirigisse seus olhos para o pecador? Por quem mais poderia haver morto o Salvador? Que pessoas há no mundo para quem os benefícios da graça poderiam ter sido destinados?

 

  1. II. Em segundo lugar, quanto mais fixamente olhamos, mais claramente vemos este fato, porque, irmãos, a obra de salvação certamente não foi levada a cabo em favor de nenhum de nós que somos salvos por causa de alguma bondade em nós mesmos. Se houvesse algo bom em nós teria sido posto pela graça de Deus, e certamente não estava ai quando, no princípio, as entranhas do amor de Jeová começaram a mover-se em favor de nós. Toma-se o primeiro sinal distintivo de salvação que foi realmente visível na terra, quer dizer, a vida de Cristo, nos é dito que Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios. Porque apenas alguém morrerá por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém ouse morrer. Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores”.Assim que, nossa redenção, meu irmão, foi efetuada antes que nascêssemos. Este foi o fruto do grande amor do Pai “que nos amou, ainda estando nós mortos em pecados.”Não havia antes, em nós, nada que pudesse ter merecido essa redenção, e certamente a simples ideia de merecer a morte de Jesus é absurda e é uma blasfêmia. Sim, quando vivíamos no pecado e amávamos o pecado, faziam-se preparativos para nossa salvação; o amor divino estava ocupado em nosso favor enquanto nós estávamos ocupados na rebelião. O Evangelho foi trazido para perto de nós, corações sinceros se puseram a orar por nós; foi escrito o texto que nos converteria, e como já disse, derramou-se o sangue que nos limpa, e foi dado o Espírito de Deus, que nos regeneraria. Tudo isso se fez quando, todavia, não buscávamos a Deus. Não é maravilhosa a passagem do livro de Ezequiel, onde o senhor passou e olhou ao bebê indefeso, lançado ao campo aberto quando não estava envolto em panos e não havia sido lavado com água, se não que estava sujo e revolvendo-se em seu sangue? Se diz que era tempo de amor, e no entanto, era um tempo de impureza e desprezo. Ele não amou ao eleito bebê por que estivesse bem lavado e adequadamente vestido, mas antes o amou quando ainda estava sujo e nu. Que cada coração crente admire a liberalidade e a compaixão do amor divino.

 

Meu viu arruinado na queda
Porém me amou, apesar de tudo;
Me salvou de meu estado perdido,
Sua misericórdia, oh, qual grande
!

 

Quando teu coração era duro, quando sua cerviz era obstinada, quando não querias se arrepender nem submeter-se a Ele, antes se rebelava cada vez mais e mais, Ele te amou, sim, a você, com afeto supremo. Por que uma graça tal? Porque haveria de ser, mas se não é porque sua natureza está cheia de bondade e Ele se deleita na misericórdia? Não se enxerga a claramente a misericórdia estendida até o pecador em vez de ser cedida em base de algo bom?

 

Olhem ainda mais atentamente. O que veio fazer nosso Senhor ao mundo? Aqui está a resposta. “Ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados”. Ele veio para ser quem carregaria, suportaria, o pecado. E vocês crêem que veio para carregar só com os pecados pequenos, os pecados sem importância do melhor tipo de homens, se existem tais pecados? Vocês supõem que Ele é um pequeno Salvador, quem veio nos salvar das pequenas ofensas? Meus amados, esse é o bem amado Filho de Jeová que vem a terra e leva a carga do pecado, uma carga que, quando a leva, descobre que não é uma carga fictícia, por que provoca Nele suores sangrentos. Tão pesada é essa carga que inclina sua cabeça à tumba, e ainda a morte debaixo dela. Esse imenso peso que estava sobre Cristo era o somatório, o total, de nossos pecados; e, portanto, quando nos fixamos nesse tema, percebemos que o Evangelho tem que a ver com os pecadores.

 

Não há pecado! Então a cruz é um equivoco. Não há pecado? Então o Lama Sabactani foi só uma queixa contra uma crueldade sem necessidade. Não há pecado! Então, oh, Redentor, quais são essas glórias que nós tão ansiosamente temos lhe atribuído? Como Tu podes tirar um pecado que não existe? A existência de um grande pecado está implícita na vinda de Cristo, e essa vinda foi ocasionada e feita necessária pelo pecado, contra o qual Jesus vem como nosso Libertador. Ele declara que abriu uma fonte, cheio com o sangue de suas próprias veias. Entretanto, para quê? Uma fonte que limpa implica sujeira. Deve ser, pecador, que de alguma forma ou outra , existe gente suja, ou se não, não teria existido uma assombrosa fonte como esta, cheia do coração de Cristo. Se você é culpado, então você é um necessitado dessa fonte, e está aberta para ti. Vem como todo teu pecado e tua sujeira e lave-te hoje, e seja limpo.

 

Foi pelos pecadores que sofreu
Agonias inexprimíveis;
Podes duvidar que és um pecador?
Se tens duvidas, então adeus esperança.

Porém, ao crer o que está escrito:
‘Todos são culpados’, ‘mortos no pecado,’
Olhando ao Crucificado
A esperança levantará tua alma.

 

Irmãos, todos os dons que Jesus Cristo venho dar, o pelo menos, a maior parte deles, implica que existe pecado. Qual é seu primeiro dom, se não o perdão? Como pode perdoar a um homem que não tem transgredido? Falo com toda reverência, não pode existir tal coisa como perdão onde não há ofensa cometida.

 

Propiciar pelo pecado e apagar a iniquidade, ambas as coisas requerem que haja um pecado para que possa ser apagado. Ou, se não, o que há de real nelas? Cristo vem para trazer a justificação, e isto mostra que deve existir uma falta de santidade natural nos homens, porque, se não, seriam justificados por eles mesmos e por suas próprias obras. E por que todas estas expressões sobre a justificação pela justiça do Filho de Deus, se os homens já estão justificados por sua própria justiça? Essas duas bênçãos, e outras do mesmo tipo, são claramente aplicáveis somente aos pecados. Para ninguém mais podem ser de utilidade.

 

Nosso Senhor Jesus Cristo veio também cingido com poder divino. Ele disse: “o Espírito do Senhor Jeová está sobre mim.” Com qual fim foi coberto com poder divino, a menos que o pecado houvesse tomado todo o poder e a força do homem, e que o homem estivera em uma condição da qual não podia ser levantado, exceto pela energia do Espírito eterno? E o que implica isto, se não que a missão de Cristo se dirige para aqueles que, através do pecado, estão sem força e sem mérito ante Deus? O Espírito Santo é dado porque o espírito do homem falhou: porque o pecado quitou a vida do homem, e o há deixado morto em transgressões e pecados.

Portanto, o Espírito Santo vem para reanimar-lo, dando-lhe uma nova vida, e esse Espírito vem por Jesus Cristo. Por conseguinte, a missão de Jesus Cristo é claramente para o culpado.

 

Não deixarei de dizer que as grandes obras de nosso Senhor, se olham elas cuidadosamente, todas tem que a ver com os pecadores. Jesus vive; é para que possa buscar e salvar o que está perdido. Jesus morre; é para que possa fazer uma propiciação pelos pecados de homens culpados. Jesus ressuscita; ressuscita para nossa justificação, e como tenho mostrado, não necessitamos da justificação a menos que houvéssemos sido naturalmente culpados. Jesus sobe ao alto e Ele recebe dons para os homens. Mas observem essa palavra especial, “Ainda dos rebeldes, para que ali habitasse Jeová Deus”. Jesus habita no céu, mas Ele vive ali para interceder. “Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles.” Assim que, tomem qualquer parte que queiram de suas gloriosas conquistas e encontrarão que há uma relação clara para aqueles que estão imersos na culpa.

 

E meus amados, todos os dons e bênçãos que Jesus Cristo trouxe para nós derivam muito de seu brilho por sua relação com os pecadores. É em Jesus Cristo que somos eleitos, e para mim a glória desse amor que elege descansa nisto, que foi dirigido para tais objetos sem mérito algum. Como pôde existir uma eleição, se houvesse sido de acordo com o mérito? Então os homens teriam se classificado por direito próprio de acordo às suas obras. Porém, as glórias da eleição brilham com a graça, e a graça tem sempre como seu envelope e como seu conteúdo interno a falta de méritos dos objetos para os quais se manifesta. A eleição de Deus não é de acordo com as nossas obras, mas antes, uma imerecida eleição dentre os pecadores. Adoremos e nos maravilhemos.

 

Voltem-se para contemplar o chamado eficaz, e veja qual delicioso é ver-lhe como uma chamada que vivifica aos mortos, e chama as coisas que não existem, como se existissem, como uma chamada aos condenados para dar-lhes perdão e favor. Voltem-se, continuando, para a adoção. Qual é a glória da adoção, se não que Deus tem adotado aqueles que eram estranhos e rebeldes, para fazer-lhes seus filhos? Qual é a beleza especial da regeneração, se não que ainda destas pedras Deus pode levantar filhos a Abraão? Qual é a beleza da santificação, se não que tem tomado criaturas tão ímpias como nós somos para fazer-nos reis e sacerdotes para Deus, e para santificar-nos completamente: espírito, alma e corpo? Penso que é a glória do céu pensar que aqueles membros do coro vestidos de branco estiveram algumas vezes criminosamente corrompidos; esses felizes adoradores foram, em outro tempo, rebeldes contra Deus.

É um quadro feliz ver aos anjos que não caíram e que conservaram seu primeiro estado, perfeitamente puros e para sempre louvando a Deus; porém a visão de homens caídos que foram divinamente resgatados está mais plena da glória de Deus. Por mais que os anjos elevem suas alegres vozes em corações perpétuos, nunca podem alcançar a doçura especial dessa canção: “Temos lavado nossas vestes e as branqueamos no sangue do Cordeiro.” Não podem experimentalmente entrar nessa verdade que é a glória que coroa ao nome de Jeová: “Tu fostes imolado e com teu sangue nos redimiu para Deus”

 

Desta maneira, abundantemente, demonstrei que quanto mais olhamos, mais claro resulta que o evangelho está dirigido aos pecadores e está especialmente planejado para seu beneficio.

 

III Agora, em terceiro lugar, é evidente que é nossa sabedoria aceitar a situação. Sei que, para muitos, esta é uma doutrina de sabor amargo. Bem amigo, é melhor que mude teu paladar, porque nunca será capaz de alterar essa doutrina. É a verdade do Deus eterno, e não pode ser mudada. O melhor que podes fazer, já que o evangelho foca aos pecadores, é estar no lugar para onde o evangelho olha; e posso te recomendar isso, não somente como política, se não que por honestidade, porque somente estará no lugar correto quanto estejas ali.

 

Parece que ouço os que apresentam objeções. “Não admiro esse sistema. Vou ser salvo da mesma maneira que um ladrão moribundo?” Assim é precisamente, senhor, a menos que sucedera que te é dada maior graça a ti que a ele, ” Porém tu não quer dizer que no tema da salvação vou ser colocado no mesmo nível que a mulher que foi uma pecadora? Fui puro e casto e vou dever minha salvação à absoluta misericórdia de Deus tanto como ela?”. Sim senhor, digo isso, exatamente assim. Só há um princípio sob qual Deus salva aos homens, e é o da graça imerecida. Quero que entenda isto. Ainda que isso se mastigue entre teus dentes como grão de areia e te enoje, não lamentará se chegas, a saber, que é o que quero dizer; porque a verdade, todavia, pode entrar em sua alma, e pode te inclinar ante seu poder. Oh, filhos de piedosos pais, vocês jovens de excelente moral e de delicada consciência, a vocês falo, sim, a vocês! Alegrem-se de seus privilégios, porém não se orgulhem deles, porque vocês também tem pecado, tem pecado contra a luz e o conhecimento, vocês o sabem. Se não caíram nos pecados mais terríveis de obras e feitos, no entanto, no desejo e na imaginação, já se extraviaram o suficiente, e em muitas coisas terrivelmente ofenderam a Deus. Se, com estas considerações ante vocês, tomam seus lugares como pecadores, não serão desonrados, mas sim que simplesmente estarão onde devem estar.

 

E então recordem, se obtêm a benção desta maneira, terão obtido ela da maneira mais segura possível. Suponham que há um número de salões para os convidados, e eu ocupei um dos melhores, poderia ser que não tenha direito de estar ali; estou comendo e bebendo das provisões para os convidados de maior classe, e meu bilhete não corresponde a esta categoria, e, portanto, me sinto muito incomodado. Cada mordida que dou, penso comigo mesmo: “não sei se me permitirão permanecer aqui, e talvez o senhor da festa venha e me diga: ‘amigo, como entraste aqui sem estar vestido de roupa de boda?’. E com muita vergonha devo proceder a tomar meu lugar em um salão de classe muito menor. “

 

Irmãos, quando começamos de baixo, e nos sentamos no salão de menor categoria, nos sentimos seguros, estamos satisfeitos porque o que temos é para nós, e não nos será tirado. Talvez, quando o rei venha, nos possa levar a um salão de melhor classe. Não há nada como começar no lugar mais baixo. Quando me afirmo na promessa como um santo, tenho minhas dúvidas acerca dela, porém quando me agarro dela como um pecador, já não me cabe nenhuma dúvida. Se o Senhor me pede que eu alimente-me de sua misericórdia, como Seu filho eu o faço, porém o diabo sussurra ao meu ouvido que estou presumindo, porque nunca fui realmente adotado pela graça; mas quando chego a Jesus como culpado, como um pecador sem méritos e tomo o que o Senhor livremente me apresenta ao crer, o diabo mesmo não pode me dizer que não sou um pecador, ou se o diz, a mentira é demasiadamente clara, e não me vem nenhuma preocupação. Não há nada como ter um título irrevogável, e se a descrição de vocês no titulo é que são pecadores, isso é indisputável porque realmente vocês o são. De tal maneira que o lugar do pecador é o verdadeiro lugar de vocês e seu lugar mais seguro.

 

Outra benção é que é um lugar ao qual podes ir diretamente, inclusive, nesse mesmo instante. Se o evangelho olhasse para os homens que tem certo estado de coração, no qual existam virtudes dignas de elogio, então, quanto tempo me tomará elevar meu coração a esse estado? Se Jesus Cristo vem ao mundo para salvar homens que tem certa medida de excelência, então quanto tempo me tomaria alcançar essa excelência? Posso enferma-me e morrer em um lapso de meia hora, e ouvir a sentença do juízo eterno, e seria para mim um pobre evangelho o que me dissesse que possivelmente obteria a salvação se alcançasse um estado que tomaria vários meses para obtê-lo. Nessa hora eu, um moribundo, sei que posso sair deste mundo, e além do alcance da misericórdia, no espaço de uma hora; que consolo é que esse evangelho venha a mim e se me dê justo agora, ainda na situação em que me encontro! Já estou nessa posição, na que a graça começa com os homens, porque sou um pecador, e só tenho que reconhecê-lo. Agora, pois, pobre alma, senta-se ante o Senhor e diga: “Senhor, veio teu Filho a salvar os culpados? Eu o sou, e confio Nele para que me salve. Morreu Ele pelos ímpios? Eu sou um, Senhor, confio em que seu sangue me limpe. Sua morte foi pelos pecadores? Senhor, assumo essa posição. Confesso-me culpado. Aceito a sentença de tua lei como justa, porém, salva-me, Senhor, pois Jesus morreu”. Se foi concluída, você está seguro. Vai em paz, meu filho; teus pecados, que são muitos, te são perdoados. Vá, filha minha, segue teu caminho, e alegre-se; o Senhor tirou teu pecado; não morrerás, porque quem crê, está justificado de todo pecado.

 

“Bendito é o homem a quem o Senhor não lhe culpa de iniquidade, e em cujo espírito não há engano”. Vá, então, à sua verdadeira posição, aceita a situação em que a graça considera que deve estar. Não fale nem de justiça nem de mérito; mas sim, apela à piedade e ao amor.

 

Certo homem havia conspirado várias vezes contra o primeiro Napoleão, e eventualmente, estando completamente nas mãos do imperador, pronunciou-se sua sentença de morte. Sua filha suplicou ardentemente por sua vida, e por fim, quando obteve uma audiência com o imperador, caiu de joelhos ante ele. “Minha filha,” disse Napoleão, “é inútil que suplique por teu pai, porque tenho a evidência mais clara de seus múltiplos crimes, e a justiça requer que morra.” A menina lhe disse: “senhor, não peço justiça, imploro misericórdia. Eu confio na misericórdia de teu coração e não na justiça do caso”. Ele a ouviu pacientemente, e pelo seu pedido, e a vida de seu pai foi salva. Imitem essa súplica e clamem: ” Tem piedade de mim, oh Deus, conforme a sua misericórdia.”

 

A justiça não te deve nada se não somente a morte, só a misericórdia pode te salvar. Deixa de lado qualquer ideia de poder defender-se eficazmente; admitA que não tem defesa e declare-se culpado. Confia na misericórdia da corte e pede misericórdia, misericórdia por pura graça, imerecida misericórdia, favor gratuito: isto é o que deve pedir e tal como na lei a uma forma de juízo chamada in forma pauperis, quer dizer, na forma de um indigente, adote ao método e como um homem cheio de necessidades, suplica o favor das mãos de Deus, in forma pauperis, e lhe será concedido.

 

IV Agora encerro esse discurso com o seguinte ponto, o qual é esta doutrina tem uma grande influência santificadora“Isso,” diz alguém, “não posso crer. Certamente tem estado outorgando um valor ao pecado, ao dizer que Cristo veio a salvar somente aos pecadores, e não chama a ninguém ao arrependimento que não aos pecadores.” Queridos senhores, ouvi esse tipo de comentários tantas vezes que já os sei de memória; as mesmas objeções contra essa doutrina foram apresentadas pelos seguidores do Papa nos dias de Lutero, e desde então, por todos os que obtêm benefícios especiais com a boa fé.

 

A opinião que a graça imerecida se opõe à moralidade não tem nenhum fundamento. Eles sonham que a doutrina da justificação pela fé conduzirá ao pecado, porém se pode demonstrar pela história que cada vez que esta doutrina tem sido magistralmente pregada, os homens são feitos mais santos, e cada vez que essa verdade tem sido obscurecida, abundou todo tipo de corrupção. A doutrina da graça e a vida sustentada pela graça se encaixam perfeitamente, e o ensino da lei e uma vida sem lei, geralmente se encontram associadas.

 

Vamos mostrar-lhes o poder santificador deste evangelho. Sua primeira operação nessa direção é esta: quando o Espírito Santo faz penetrar a verdade do perdão imerecido em um homem, muda completamente seus pensamentos no concernente a Deus. “O quê?” diz ele, “Deus tem perdoado-me gratuitamente de todas as minhas ofensas por causa de Cristo? E me ama apesar de todo meu pecado? Eu não sabia que Ele fora assim, tão cheio de graça e bondade! Pensei que Ele era duro; chamei-lhe de tirano, colhendo onde não havia plantado, porém, Ele sente assim por mim?”. ” Então”, diz a alma, ” então eu o amo por isso”. Há uma mudança radical de sentimento, um giro completo tão logo que ele entende a graça redentora e o amor até a morte. Ao contemplar a graça, se produz a conversão.

 

Mais ainda, esta grandiosa verdade faz algo mais que mudar a um homem, o inspira, o derrete, o vivifica e o inflama! Esta é uma verdade que sacode as profundezas do coração e enche o homem de vivas emoções. Nós conversamos sobre fazer o bem, e dos justos, e da justiça , e da recompensa e castigo, e ele ouviu tudo isso que poderia ter tido alguma influência sobre ele, mas não o sentia profundamente. Uma lição assim é demasiadamente fria para aquecer o coração. Contudo, a verdade que enche o coração do homem lhe parece nova e excitante. Vai mais ou menos assim: Deus, por sua pura misericórdia, perdoa ao culpado, e Ele te perdoou a ti. Então isto o desperta , o sacode, toca a fonte de suas lágrimas, e move todo seu ser. Possivelmente, quando ouve o evangelho pela primeira vez, não lhe preocupa e até o odeia, todavia quando chega-lhe com poder , tem um controle maravilhoso sobre ele. Quando recebe sua mensagem como realmente dirigida a ele, então seu frio coração de pedra se converte em carne; quente emoção, amor terno, humilde desejo, e um sagrado anelo pelo Senhor se agita em seu ventre. O poder vivificante desta verdade divina, assim como seu poder de conversão, nunca podem ser admirados em excesso.

 

Além disso, quando essa verdade entra no coração, ela dá um golpe mortal na arrogância do homem. Muitos homens se haveriam feitos sábios, simplesmente pensando que já o são; e muitos teriam se feito virtuosos, somente concluindo que já tem alcançado a virtude. Eis aqui, esta doutrina golpeia duramente o crânio para tirar-lhes a confiança na própria bondade de vocês, e faz com que vocês sintam sua culpa; e ao fazer isso, arranca o grande mal do orgulho. Um sentido do pecado é o umbral da misericórdia. Uma consciência da própria incapacidade, uma dor por todas as ofensas passadas, é uma preparação necessária para uma vida mais elevada e mais nobre. O evangelho cava os cimentos, cria um grande vácuo e dessa forma faz um espaço para colocar as gloriosas pedras de um nobre caráter espiritual, no devido lugar.

 

E também, quando se recebe essa verdade, é certo que brota na alma um sentimento de gratidão. O homem a que se tem perdoado muito, com toda segurança, em troca, amará muito. A gratidão a Deus é a grandiosa mola que move a santa ação. Aqueles que fazem o justo para serem recompensados por isso atuam de maneira egoísta. O egoísmo está no âmago de seu caráter; se abstém de pecar só para que seu Eu evite o sofrimento, e obedecem somente para que seu Eu esteja seguro e feliz. O homem que faz o justo, não pelo céu ou pelo inferno, mas porque Deus o salva, e ama a Deus que o salvou, é verdadeiramente o homem que ama o justo. O que ama o justo porque Deus o ama, tem sido levantado do pântano do egoísmo e é capaz da virtude mais elevada; sim, tem nele uma fonte viva, que fluirá e se derramará em uma vida santa enquanto viva.

 

E, queridos irmãos, penso que todos verão que o perdão imerecido para os pecadores promove uma parte do caráter verdadeiro, quer dizer, disposição para perdoar a outros, porque a quem se lhe há perdoado muito, resulta-lhe ser fácil perdoar as transgressões dos demais. Se não o faz, bem se pode duvidar se tem sido ele mesmo perdoado; entretanto, se o senhor há apagado sua divida de mil talentos, ele de imediato perdoará os cem centavos que seu irmão lhe deve.

 

Por último, alguns de nós sabemos, e quiséramos que todos o soubessem por experiência pessoal, que um sentimento de favor imerecido e livre perdão, é a alma mesma do entusiasmo, e o entusiasmo é para os cristãos o que o sangue é para o corpo. Alguma vez vocês se entusiasmaram diante de um discurso frio sobre a excelência da moralidade? Sentiram que sua alma sacudia-se dentro de vocês ao escutar um sermão sobre as recompensas da virtude? Alguma vez entusiasmaram quando lhes foi dito sobre os castigos da lei? De nenhuma forma, senhores; contudo preguem as doutrinas da graça, deixem que o favor soberano de Deus seja exaltado, e observem as consequências.

 

Há gente que está disposta a caminhar muitos kilômetros e aquentar juntos sem cansaço durante muitas horas para ouvir isto. Tenho conhecido aos que suportam duras caminhadas de muitas milhas para escutar a esta doutrina. Por quê? Porque o homem era eloquente, ou porque era bom orador? Nada disso: algumas vezes a pregação tem sido má, apresentada com uma linguagem sem educação, e, no entanto, esta doutrina sempre tem movido as pessoas. Existe algo na alma do homem que está buscando o evangelho da graça, e quando vem, há sempre fome para ouvi-lo. Vejam como nos tempos da Reforma, quando existia a pena de morte por ouvir um sermão, como que as gentes se reuniam à meia-noite; como caminhavam largas jornadas até os desertos e as covas para escutar o ensino destas velhas verdades grandiosas.

 

Há uma doçura sobre a misericórdia, da misericórdia divina, graciosamente dada, que captura o ouvido do homem e sacode seu coração. Quando esta verdade penetra na alma, gera entusiastas, mártires, confessores, missionários, santos.

 

Se existem cristãos sérios e cheios de amor a Deus e ao homem, são aqueles que sabem o que a graça tem feito por eles. Se há aqueles que permanecem fiéis ante as críticas e cheios de gozo diante das penalidades e as cruzes, são aqueles que estão conscientes de sua dívida para o amor divino. Se existem aqueles que se deleitam em Deus enquanto vivem, e descansam Nele quando morrem, são os homens que sabem que são justificados pela fé em Jesus Cristo que justifica ao ímpio.

 

Toda a glória seja para o Senhor que elevou ao mendigo, desde o montão de esterco e o colocou em meio aos príncipes de Seu povo. Ele toma aos descartados pelo mundo e os adota como membros de sua família e os faz herdeiros de Deus por Jesus Cristo. O Senhor nos permite conhecer o poder do evangelho sobre nosso eu pecador. O Senhor nos faz querer o nome, a obra e a pessoa do Amigo do Pecador. Oxalá que nunca esqueçamos o buraco do poço do qual fomos tirados, nem a mão que nós resgatou, e nem a bondade imerecida que moveu a essa mão. A partir de agora, e cada vez com maior zelo, temos que falar da infinita graça. “Graça imerecida e amor até a morte”. Bem diz essa canção espiritual: ” Soem esses sinos encantadores”.

 

Graça imerecida e amor até a morte são as janelas de esperança do pecador! Nossos corações se alegram com essas palavras. Glória a ti, Oh Senhor Jesus, sempre cheio de compaixão. Amém.

 

 

 

 

ORE PARA QUE O ESPÍRITO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA TRAZER CONHECIMENTO SALVIFÍCO DE JESUS CRISTO E PARA EDIFICAÇÃO DA IGREJA

 

 

FONTEhttp://www.spurgeon.com.mx/sermon1345.html

Traduzido do espanhol, do sermão “¿Quiénes Necesitan el Evangelio?”,  traduzido por Allan Román

Sermão nº 1345  —Volume 23 do The Metropolitan Tabernacle Pulpit

 

Tradução: Armando Marcos Pinto

Revisão: Plabyo Geanine Nunes de Oliveira

 

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